Medicina nuclear alia tecnologia e radiofármacos no combate ao câncer
Em 1896, Antoine Henri Becquerel descobriu a radioatividade, chegando a ganhar um Prêmio Nobel de Física, em 1903, junto com Pierre Curie e Marie Curie. Quase 80 anos depois de sua descoberta, a Medicina Nuclear foi reconhecida pela Associação Americana de Medicina como uma especialidade médica que realiza diagnóstico e terapia através da radiação emitida por elementos radioativos (radioisótopos). De lá para cá, os frutos das pesquisas realizadas mundo a fora e da tecnologia, cada dia mais avançada, tem dado mais esperança a quem precisa de poderosas armas contra o câncer.
O Centro de Diagnósticos da Santa Casa de Misericórdia de Maceió é considerado um dos mais eficientes no estado. Na unidade são realizados exames e tratamentos de pacientes com necessidades variadas. O destaque vai para a cintilografia que vem auxiliando no diagnóstico de várias doenças oncológicas, como câncer de próstata, de tireoide e de tumores neuroendócrinos.
De acordo com o especialista em medicina nuclear, Marcelo Farias, o investimento realizado pela instituição tem garantido bons resultados para os pacientes. “O Serviço de Medicina Nuclear foi criado pelo Dr. Duílio Marsiglia, primeiro endocrinologista de Alagoas. Hoje, o hospital dispõe de duas Gama Câmara utilizadas na realização das cintilografias, uma adquirida a menos de um ano. Isso reduziu a fila de pacientes oncológicos do SUS e melhorou o atendimento na instituição”, disse.
Para garantir a eficiência dos tratamentos, todos os radiofármacos da Santa Casa de Maceió passam por controle de qualidade antes de serem administrados aos pacientes atendendo a normas nacionais e internacionais de segurança assistencial. O gerenciamento dos medicamentos é realizado pela farmacêutica com especialização em radiofarmácia pelo Hospital Albert Einstein, Eline da Silva Santos.
A iodoterapia para câncer de tireoide está entre os tratamentos executados pela Medicina Nuclear da Santa Casa de Maceió. A célula tireoide absorve praticamente todo o iodo presente no sangue, então, quando uma dose de iodo radioativo, conhecida como I-131, é administrada, pode destruir a célula tireoidiana e quaisquer outras células cancerígenas da tireoide, com pouco ou nenhum efeito colateral para o corpo.
“A Santa Casa dispõe de um quarto terapêutico para a realização de tratamento de pacientes com câncer de tireoide com iodo terapia. É o único do estado para esse fim. Além do tratamento do câncer tireoidiano, o espaço também é utilizado para o tratamento de pacientes com tumor neuroendocrino usando o Meta-iodobenzilguanidina (MIBG) – I 131”, disse Marcelo Farias.
Desde 2015, foram tratados 870 pacientes, uma média de 174 por mês. O tempo máximo de internação é de dois dias. “É um favor que o paciente faz a sociedade ao não expor seus familiares e amigos a radiação dos radiofármacos que tomou. Para o paciente não tem efeito ou complicação, mas é preciso ter cuidados no contato com os demais”, disse o especialista.
A iodoterapia é amplamente indicada para pacientes com câncer de tireoide papilífero ou folicular (câncer diferenciado da tireoide). Mas, não é utilizada para tratar carcinomas anaplásicos e medulares da tireoide, uma vez que esses tipos de câncer não captam iodo. Ela é mais eficaz em pacientes com níveis altos de hormônio tireoestimulante (TSH) no sangue, pois a substância estimula o tecido da tireoide (e às células cancerosas) a absorver o iodo radioativo.
Tumor neuroendócrino pode ser assintomático, o que dificulta o diagnóstico
Pouco conhecido e raro entre a população, o tumor neuroendócrino é uma proliferação anormal de células neuroendócrinas – linhagem de células com funções distintas dependendo do órgão em que se encontram. Podem surgir na maior parte dos órgãos do corpo, porém mais de dois terços têm sua origem no estômago, intestino (delgado ou grosso) e pâncreas. Não se conhece a causa exata deste tumor, e geralmente possuem crescimento lento e muitas vezes assintomático e indolor, dificultando e atrasando seu diagnóstico.
O tumor também pode ser combatido com cirurgia, outros casos com quimioterapia, embolização de metástases no fígado e uso de medicações com análogos de somatostatina. “De forma pioneira, em 2017, a Santa Casa de Maceió iniciou o tratamento ambulatorial com o Lutécio-177, destinado a tumores neuroendócrinos. Fizemos o tratamento de um paciente com esta substancia, cujos resultados são muito positivos. Números de alguns centros internacionais apontam para aproximadamente 35% de resposta, com aumento da sobrevida dos pacientes e melhora da sua qualidade de vida”, destacou o médico André Gustavo.
O tratamento é uma arma contra o câncer de próstata
Segundo tipo de câncer mais comum no Brasil entre os homens, atrás apenas do câncer de pele não-melanoma, o tratamento do câncer de próstata tem alcançado bons resultados com o novo tratamento realizado pelo Serviço de Medicina Nuclear da Santa Casa de Maceió.
Trata-se do moderno radiofármaco Xofigo (cloreto de radio-223), um antineoplásico indicado para casos avançados de pacientes com câncer de próstata, metástase óssea e dor associada. Liberado em 2014 pela FDA (agência reguladora americana) e em 2016 pela Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária), o radio-223 foi administrado pela primeira vez em Alagoas, em 2017, num paciente de 70 anos. Desde então, nove pacientes foram tratados, e um segue o acompanhamento clínico.
“Os benefícios são o aumento de sobrevida geral do paciente, melhora da dor e da qualidade de vida, além do retardo no aparecimento de eventos esqueléticos, como fratura e compressão da medula espinhal, que pode exigir cirurgia ou radioterapia para tratar tais complicações”, disse o médico nuclear André Gustavo Pino, lembrando que são necessários seis meses de tratamento, sendo uma aplicação por mês, para que os resultados alcancem o seu objetivo.
Comparando com o radioisótopo utilizado no tratamento de tireoide, onde o paciente precisa ficar em isolamento, o radio-223 tem um alcance menor que 1mm ao seu redor, o que permite atingir o tumor e reduzir os efeitos sobre partes sadias como a medula óssea. “O paciente não precisa ficar em isolamento e pode voltar a sua rotina após a aplicação”, acrescentou Pino.
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