IV Fórum de Ética Médica debate avalanche de ações na Justiça
Nas manchetes dos jornais um tema tem preocupado magistrados, gestores públicos da saúde, procuradores e defensores públicos, médicos, executivos hospitalares, dirigentes de planos de saúde, advogados e toda uma cadeia de profissionais que lidam com o tema. Estamos falando da judicialização da saúde.
Este fenômeno tem origem nas eventuais falhas da assistência médica prestada pelo poder público e pela iniciativa privada aos usuários, o que tem levado os brasileiros a obter assistência médica, medicamentos e insumos terapêuticos por via judicial.
Se por um lado a judicialização da saúde é um direito do cidadão, por outro vem se mostrando nociva em virtude dos excessos, seja pela avalanche de ações que começam a travar as Varas da Justiça, seja pelos gastos com tratamentos não cobertos pelo Sistema Único de Saúde ou muito dispendiosos, bem acima dos valores de mercado.
Para discutir este espinhoso tema, a Direção Médica e o Conselho de Ética da Santa Casa de Maceió promoveram no último sábado (24), no Maceió Atlantic Suítes, o IV Fórum de Ética Médica da instituição. A iniciativa contou com o apoio e a participação da SantaCoop e dos conselhos Federal e Regional de Medicina de Alagoas.
A ideia do provedor Humberto Gomes de Melo e do diretor médico da Santa Casa de Maceió, Artur Gomes Neto, foi abrir espaço para que todas as partes apresentassem sua visão e suas propostas de solução para o problema.
Coletividade x cidadão
A maior parte das ações que abarrotam os tribunais brasileiros põe em lados opostos os gestores públicos da saúde e os órgãos de defesa do cidadão (como a Defensoria Pública) e de defesa da coletividade (como o Ministério Público).
Os gestores públicos da saúde, tanto do Estado como do município de Maceió, afirmam que os recursos da saúde são limitados e que as demandas individuais muitas vezes retiram recursos que seriam utilizados em prol da coletividade.
“É justo que o poder público beneficie um único usuário em detrimento de toda uma comunidade?”, perguntou o médico Antonio de Pádua, superintendente de Regulação, Avaliação, Controle e Auditoria do Estado.
Segundo Pádua, em 2010 foram gastos R$ 15,3 milhões com ações judiciais, saltando em 2011 para R$ 29,3 milhões, ou seja, quase o dobro. Este ano o valor superará facilmente os R$ 30 milhões. Outro número também surpreende: em 2009, as despesas com medicamentos via decisão judicial representava apenas 14,7% do total gasto com toda a população. Até dezembro deste ano esse patamar deverá chegar a 100% do total. “O conceito de integralidade definido pela Constituição, onde todos têm direito a todo tipo de medicamento e a todo tipo de tratamento, terá de ser revisto pelo Supremo Tribunal Federal, sob pena de levar o sistema de saúde à falência”, alertou Antonio de Pádua.
O outro lado
Se os gestores estão apreensivos com os números, os magistrados, defensores e procuradores públicos estão preocupados com a assistência à saúde da população, ou seja, com o acesso do cidadão aos medicamentos e tratamentos indisponíveis na rede do SUS mas indicados pelos médicos.
O defensor público Otoniel Pinheiro frisou que o problema da judicialização não é provocado pela Defensoria Pública ou pelo Judiciário. “O que falta é investimento no setor saúde”, disse o defensor público, revelando que o Brasil investe apenas 5,9% do orçamento da União em saúde, quando a média internacional chega a 14,3%. Já o promotor público Antiógenes Marques concorda com o diagnóstico mas vai um pouco mais além. “A judicialização da saúde ocorre porque o serviço regular de atendimento ao cidadão apresenta muitas falhas, sendo a única ferramenta que o cidadão possui para garantir os direitos garantidos pela Constituição”. Por outro lado, os magistrados precisam estar atentos para a real necessidade da demanda e se há alternativas disponíveis no SUS. É senso comum que interessa à indústria farmacêutica forçar o SUS a incluir novos e caros medicamentos nas compras governamentais e a melhor forma para isso é estimular as ações judiciais via receita médica.
“A saída para o problema passa essencialmente por duas providências”, disse o desembargador José Carlos Malta. “Uma maior efetividade na assistência à saúde da população por parte do poder público e a criação de assessorias especializadas para subsidiar as decisões dos juízes”. A implantação de um comitê para consulta dos magistrados ou de varas especializadas foi apoiada pelo juiz Jerônimo Roberto; pelos advogados Gustavo Uchôa (Unimed) e Eduardo Dantas (Associação Brasileira de Direito da Saúde); pelo presidente do CRM, Fernando de Araújo Pedrosa; e pelo médico Alfredo Marinho Rosa. Ao final do evento, o secretário de saúde de Maceió, Adeilson Loureiro, anunciou a criação de uma câmara técnica especializada em saúde para assessorar à Justiça estadual e a atuação de um comitê que já funciona na Justiça Federal.
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